quinta-feira, 30 de abril de 2009




Rohypnol

- A nível de direção teatral, sinto que nos falta mais incentivos. As pessoas querem respirar e se alimentar de arte, mas não tem condição de consumir isso. É como diz aquela música...como é mesmo o nome? Enfim.
Estou dirigindo uma peça de Nelson Rodrigues me inspirando nos contos de Sniver Galho. Ele é meio Nelsonrodrigueano. Uso uma linguagem concretista. Não sei se as pessoas vão entender isso... não é como ver uma partida de futebol.

- Ahan... Por falar nisso, sabe como ficou o jogo do Mengão ontem?

quarta-feira, 29 de abril de 2009


Válium

- Hoje faço trabalhos tridimencionais em argila, gesso, ferro e qualquer coisa que possa montar, soldar, colar, junta, amarrar. É uma maneira de dizer para as pessoas que estamos desperdiçando coisas e que estas mesmas coisas podem ganhar outro sentido. Um sentido artístico na perspectiva do outro.

- É por isso que você usa essa barba?

terça-feira, 28 de abril de 2009


Rivotril
(Stencil de Banksy, grafiteiro nascido em Bristol, Reino Unido)

Sou artista mano. Faço grafite, né brow. Por que o negócio é subverter a ordem e ser contemporâneo, desconstruir e depois construir uma nova linguagem pictórica urbana carregada de metáforas. Pode crê?

- Aahhh...saquei! Que nem o homem das cavernas, só que de boné...

segunda-feira, 27 de abril de 2009


Lexotan


- Acho que a cidade precisava de mais espaços para que o teatro aconteça. As pessoas adoram teatro. Tenho certeza. Minha sensibilidade de atriz consegue ver isso nos olhos delas.


- ?


- ...desculpa, tava dormindo.

quinta-feira, 23 de abril de 2009


Um viva aos amigos
(a tela As damas d'Avignon - Picasso bem que poderia ser uma ironia)


- A cada dia que passa, tenho mais medo de me tornar aquilo que menos gosto em mim. Você me entende?

- Claro!

- Acho que teria que viver uns 500 anos pra aprender a me perdoar e me entender melhor.

- Legal. Mas eu só tenho duas horas. Bora comer umas puta.

- Demorô

Formalismo


Já imaginou se todos nós, honrados cidadão e pagadores de impostos nos tratássemos com o mesmo respeito com que as mais importantes autoridades se tratam? Imagine como seriam nossos diálogos.

No trânsito
- Vossa Excelência comprou a carteira aonde?
- Por que Vossa Excelência não vai se foder?
- Vossa Excelência me respeite ou quebro seu nariz, filho da p...

Em frente a construção
- Ohhh gostosa! Vossa Excelência é a nora que minha mãe sempre quis.
- Vossa Excelência não se enxerga não?

Na blitz
- Vossa Excelência pode me mostra sua habilitação?
- Vossa Excelência sabe com quem está falando?
- Vossa Excelência deve saber que eu não me importo, desde que não seja ministro, senador ou qualquer coisa do tipo.

Na esquina
- Vossa Excelência está a serviço?
- Sim Senhor
- Será que Vossa Excelência poderia cair de boca?
- Claro. São 50 dinheiros.
- Vossa Excelência perdeu o juízo? 50 dinheiros por um boquete?
- Vossa Excelência pode escolher: É pagar ou largar.
- Vossa Excelência me deixa sem escolha. Dinheiro está na mão
- Pois não. Calcinha está no chão.

Na boca de fumo
- Vossa Excelência vai querer quanto?
- Vossa Excelência me veja 50 gramas de fumo do bom, sem chute.
- Vossa Excelência me respeite, pois esta é uma boca de gente séria.
- Vossa Excelência me perdoe. Mas veja logo esse bagulho... os homi tão na cola.

quarta-feira, 22 de abril de 2009


Free Hughs

Que merda. Lá vem o pentelho.

Ele não está com sorte hoje. Prometo não ser mal educado com ele. Não tenho paciência pra isso.
Ele tá chegando. Vou fingir que não é comigo.
Caralho. Sai fora moleque.
Não me faça mostrar a mim mesmo o quanto sou mal humorado e a você mesmo, o quanto é imbecil sem a mínima criatividade.
Lá vem ele. Fudeu.

O cara com a placa “free hughs” me espera de braços abertos.

- Quer um abraço grátis?

- O que? Um abraço grátis?

- Sim

- Pra que? Não to carente. Se gostasse de gente estranha me esfregando andava de ônibus.

- Tudo bem (com a cara de quem não tinha ensaiado a fala)

- Não é nada pessoal amiguinho. Se fosse a tua amiga no seu lugar, adoraria me esfregar naquele par de peitinhos quase intactos.

Lá vai o pagador de mico oficial dos eventos alternativos. Preciso me lembrar de proibir meu filho de reproduzir essas merdas que circulam pela internet.

segunda-feira, 20 de abril de 2009


No future

Nos seus olhos refletidos no grande espelho iluminado do banheiro, ele via um resto de euforia passageira, misturada com o que sobrou de prazer.


Só agora ele percebera o esforço que fez, vendo o rosto suado, a boca seca e o coração na garganta. Ele não precisava se olhar no espelho, mas uma razão o fez levantar os olhos que fitavam o fundo da pia de mármore.

Queria saber com que cara ficava imediatamente após ter gozado. Foi uma punhetinha breve, sem muita inspiração. Ele não sabia se era típico dos homens. Mas sabia que aquela atitude era típica dele.


Outra vez encarou o fundo da pia e, vendo aquilo tudo escorrendo lentamente pelo ralo, pensou profundamente sobre o que havia feito.


Concluiu com a sabedoria dos solitários: essa porra não tem futuro.

quarta-feira, 15 de abril de 2009


Dali do mar

Entre garrafas pets e bitucas de cigarro, vem vindo o grão de areia com seu romântico jeito malandro, cheio de ginga e cheirando a maresia. Ele encara aquela pedrinha roliça e tasca:

- E ai minha pedra, bora fazer um castelo?

No que pedrinha responde:

- Castelo de areia? Vocês grãos são todos iguais!

terça-feira, 14 de abril de 2009




"Sigo tentando ler lábios e entrelinhas."
Mike Merdha

segunda-feira, 13 de abril de 2009


Monólogos de Mike Merdha II

Você também concorda que ser artista é a melhor desculpa pra quem não tem a mínima idéia de que espaço útil ocupa no planeta? Ser artista é uma necessidade egocêntrica pra quem precisa desesperadamente de atenção. Será por quê a gente tem essa necessidade incurável de “se expressar”? Eu grito, xingo, declaro guerra, sussurro, peido, vomito e arroto. Estou sendo eu mesmo, integralmente, fora desse meu insano vaso sanitário. Você também concorda que o que a gente quer mesmo é ser visto, lido, reconhecido, admirado e outras coisas do egogênero? Qual o problema em escrever e guardar na gaveta? Qual o problema em pintar e colocar fogo logo depois? Daí você me pergunta por que to publicando essa merda... Eu preciso me expressar, porra!

segunda-feira, 6 de abril de 2009


Vácuo

Tantas músicas e ninguém pra dividi-las debaixo do céu negro respingado de estrelas pálidas. Músicas pra se ouvir em quebradas silenciosas, no capô do carro. Tanto tempo juntando canções como um garimpeiro. Um monte delas. Tanto tempo acumulando trilhas sonoras pra momentos que teimam em não chegar nunca. Tantas letras para serem cantadas em inglês de taxista e baladas para serem dançadas no asfalto áspero. Tanto cafuné desperdiçado no próprio cabelo encaracolado. Tanto fogo gasto no vácuo. Tanta conversinha boa. Estão encerradas as apresentações de canções e os cafunés desperdiçados nos próprios cabelos... quanto ao fogo, ele não se propaga no vácuo...

quinta-feira, 2 de abril de 2009


Monólogos de Mike Merdha II


Se é pra ficar na merda, quero ganhar asas... como as moscas.